sexta-feira, 20 de julho de 2007

Timor Leste: Juiz insiste em capturar Reinado contrariando PR


O juiz do processo do major fugitivo Alfredo Reinado renovou o seu mandado de detenção, contrariando a suspensão da operação de captura decretada pelo Presidente de Timor-Leste, segundo uma carta a que a Lusa teve acesso.

O mandado de detenção do major Alfredo Reinado, como de outros elementos do seu grupo, foi renovado por despacho de 18 de Maio.

Uma carta do juiz português Ivo Rosa datada de 18 de Julho, a que a Lusa teve acesso, recorda que os mandados em causa são para «cumprir por qualquer autoridade policial ou militar» e questiona os comandantes das várias forças sobre o incumprimento da ordem judicial.

Ivo Rosa, um dos magistrados internacionais a exercer funções directas e pedagógicas no sistema de justiça de Timor-Leste, classifica de «ordens ilegais» as instruções da Presidência da República de 19 de Junho, concretizadas pelo procurador-Geral da República (PGR), para a emissão de «salvo-condutos» em nome de Alfredo Reinado e do seu grupo.

A carta em que o PGR Longuinhos Monteiro anunciou às forças de segurança a existência destes «salvo-condutos» foi divulgada em primeira-mão pela Lusa, a 04 de Julho.

«Os tribunais são órgãos de soberania», sublinha a carta agora enviada pelo juiz Ivo Rosa aos mesmos destinatários, recordando que «as decisões dos tribunais são de cumprimento obrigatório e prevalecem sobre todas as decisões de quaisquer autoridades».

O documento do juiz foi recebido, nas últimas 48 horas, pela Presidência da República, pelo chefe do Estado-Maior das Falintil-Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL), pelo chefe da missão das Nações Unidas (UNMIT) e pelos comandantes da UNPol, do Subagrupamento Bravo da GNR e das Forças de Estabilização Internacionais (ISF).

O juiz Ivo Rosa deixa claro que as forças policiais e militares a operar em Timor-Leste «apenas devem obediência à decisão judicial que decretou a prisão preventiva e ordenou a detenção dos arguidos».

«O resultado das diligências para o cumprimento dessa ordem apenas deve ser comunicado ao Ministério Público e ao Juiz titular do processo», diz o juiz português.

«O cumprimento dos mandados deve ser feito de forma incondicional e sem quaisquer cedências ou concessões» e «qualquer processo de negociação com vista à entrega voluntária dos arguidos apenas poderá ter com finalidade a detenção dos mesmos e sem qualquer concessão», afirma o juiz.

«Os restantes órgãos de soberania do Estado não podem e nem devem tomar conhecimento do conteúdo dos actos tendentes à detenção dos arguidos», conclui o magistrado.

Ivo Rosa cita a Constituição de Timor-Leste para mostrar que «os tribunais são órgãos constitucionais aos quais é confiada a função jurisdicional exercida por juízes», acrescenta a carta do magistrado.

«O poder judicial é exercido pelos tribunais e é separado dos outros poderes e tem uma posição jurídica idêntica à dos restantes órgãos constitucionais de soberania», afirma o juiz, por referência à ordem de cancelamento da operação contra o grupo de Alfredo Reinado emitida por José Ramos-Horta há quatro semanas.

«O Parlamento Nacional é o órgão adequado a legislar, o governo para executar e administrar e os tribunais para exercerem as funções jurisdicionais», explica também o juiz.

«Haverá violação do princípio da separação de poderes sempre que um órgão de soberania se atribua, fora dos casos em que a constituição expressamente o permite ou impõe, competência para o exercício de funções que essencialmente são conferidas a outro e diferente órgão», sublinha a carta.

A carta termina com a notificação do brigadeiro-general Mal Rerden, comandante das ISF, para informar se recebeu a «ordem ilegal» do PGR «e, em caso afirmativo, para não acatar essa ordem e cumprir a decisão judicial que ordenou a detenção dos arguidos em causa».

Diário Digital / Lusa

19-07-2007 16:20:00

6 comentários:

Anónimo disse...

O sangue dos policias massacrados a um ano mesmo nas barbas da UN nao foi ate agora resolvido no entanto o juiz da UN fechou os olhos e passou por cima. O mandato de juiz tem certa qualidade mas como a foto e descricao deste blog diz mesmo ao lado, "O fim que o Alfredo escapou, onde estao os culpados?".

Anónimo disse...

Com este juiz, ele ainda vai tirar um mandato de a Fretelin Governar mesmo contra a Constituicao.

Anónimo disse...

«Haverá violação do princípio da separação de poderes sempre que um órgão de soberania se atribua, fora dos casos em que a constituição expressamente o permite ou impõe, competência para o exercício de funções que essencialmente são conferidas a outro e diferente órgão», sublinha a carta.

Será que agora o PR vai perceber o Artigo 69.º da Constituição, que estipula o Princípio da separação dos poderes e que diz expressamente "Os órgãos de soberania, nas suas relações recíprocas e no exercício das suas funções, observam o princípio da separação e interdependência dos poderes estabelecidos na Constituição."

Fico sentada à espera da resposta, porque o Horta não faz o que é da sua competência mas interfere, atrapalha e subverte o que é da competência dos outros órgãos de soberania.

Anónimo disse...

Todos os mortos são cidadãos Timorenses e filhos de Deus e a lei aplica-se a todos os vivos de igual modo.

Fez muito bem o juiz em lembrar que apenas os tribunais têm competência na justiça.

Anónimo disse...

concordo totalmente com o comentário anterior, ainda que haja casos em que a justiça não esteja, ou pelo menos não pareça estar, a funcionar.
quanto à separação de poderes parece-me uma questão basilar para a construção sustentável de um estado de direito. infelizmente para os timorenses, em timor, são muitos (malais e locais) os que reinvidicam e se arrogam poderes que sabem não lhes competir. por isso mesmo, bem haja o bom senso do dito juiz, e diria também, bem haja a sua coragem, pois apesar de há já um ano se saber que encabeça uma lista de alvos a abater (o que tem implicado uma protecção policial pesada) mantém o brio profissional que se lhe conhece.

Anónimo disse...

Para quem não percebe a actuação do juiz segue-se a análise do JSMP e o respectivo link no fim:

JUDICIAL SYSTEM MONITORING PROGRAMME
PROGRAMA DE MONITORIZAÇÃO DO SISTEMA JUDICIAL
ACTUALIZAÇÃO DE JUSTIÇA
Período: Julho
N.º 8/2006
O CASO DE ALFREDO REINADO
Nesta actualização de Justiça o JSMP analisa a prisão e detenção na semana
passada de Alfredo Reinado e de um grupo de seguidores.

(…)
A ADF concluiu que existia uma ameaça de segurança e que era necessário realizar prisões.
Prenderam Reinado juntamente com vinte outros elementos. Alguns dos
elementos presos, não todos, eram anteriores militares. Todos os que foram
presos foram levados para o centro de detenções da Joint Task Force (JTF) (força
militar conjunta) em Caicoli.
(…)
O JSMP foi informado de que a prisão não foi iniciada pela Procuradoria mas foi
levada a cabo autonomamente pela JTF.
Conforme exigido pelo Código de Processo Penal, todas as pessoas foram
apresentadas perante um juiz para interrogatório no prazo de 72 horas.
Uma audiência teve lugar a 26 de Julho e as restantes a 27 de Julho, todas elas
perante o mesmo juiz internacional. Sete pessoas foram libertadas nessa altura,
todas civis. A Reinado e a 13 outros foi ordenada a sua detenção preventiva.
Os promotores públicos indicaram que tencionavam realizar a investigação de
certos alegados crimes incluindo, entre outras coisas, assassinato e /ou tentativa
de assassinato (relacionado com o incidente em Fatuahi a 23 de Maio, no qual
ocorreu um tiroteio entre o grupo de Reinado e a FDTL) e roubo e /ou
apropriação ilegal (relacionada com a aquisição de armas da FDTL por parte de
Reinado). Parece igualmente que, uma vez que as prisões iniciais foram
realizadas com base na suspeita de violações dos regulamentos da UNTAET
referentes às armas, a investigação poderá considerar também esses crimes.
(…). Foram ordenadas prisões preventivas a todos os membros do grupo
segundo o Código de Processo Penal . (…)
Durante o seu interrogatório pelo juiz, Reinado afirmou que não reconhecia a
legitimidade do juiz internacional. Os seus advogados argumentaram que as
prisões foram realizadas ilegalmente por terem sido levadas a cabo sem um
mandado de captura. O juiz rejeitou este argumento, afirmando que existia um
fundamento para a prisão sem um mandado de captura. (…)

Legalidade da prisão sem mandado de captura
O JSMP foi informado de que todas as prisões neste caso foram levadas a cabo
pela ADF. Os poderes da ADF para realizar prisões estão cobertos pelo Status of
Forces Agreements (Acordo SOFA) a vigorar entre Timor-Leste e a Austrália. Esse
documento estabelece que o pessoal da ADF detém os mesmos poderes
exercidos pela Polícia de Timor-Leste (a PNTL).
Os poderes da PNTL para realizar prisões estão estabelecidos no Código de
Processo Penal. A regra geral é a de que essas prisões só podem ser levadas a
cabo no seguimento da emissão de um mandado de captura por um juiz, mas
existem duas excepções a esta regra:
(1) Casos de flagrante delito, ou seja, situações em que o crime está em vias
de ser cometido ou acabou de ser cometido, incluindo casos em que logo
após um crime ser cometido, o suspeito é encontrado com itens ou sinais
que claramente indicam que ele ou ela participaram no crime. (…)
O caso envolveu um crime em flagrante delito porque a posse de
armas era contínua na altura da chegada da ADF. (…) O JSMP acredita que a decisão do juiz de que as prisões eram legais parece estar bem fundamentada.

Adequação da ordem de detenção
O Código de Processo Penal permite a um juiz impor aos arguidos medidas
preventivas restritivas nos casos em que haja o receio de que o arguido possa
fugir ou danificar ou interferir na prova, possa realizar actividades criminosas ou
perturbar a ordem pública.
No caso presente, o JSMP foi informado de que o juiz se preocupou com o facto de a ordem pública poder ser perturbada pelos arguidos e que existia a possibilidade de a prova ser destruída. (…)
Se a juíza chegou à conclusão de que se cumpriram estes requisitos no caso de
Reinado e do seu grupo, então impôs correctamente a detenção preventiva.

Atrasos no início das investigações da Procuradoria-Geral
O JSMP está preocupado com o facto de não ter existido nenhuma acção anterior
por parte da Procuradoria-Geral (PG). A PG declarou agora a sua intenção de
investigar Reinado e os seus seguidores, não somente em relação ao crime em
flagrante delito de posse ilegal de armas, mas também em relação a diversos
incidentes anteriores que remontam a Maio. O JSMP não tem conhecimento de
que já estivesse a decorrer alguma investigação oficial da PG, para estes
alegados crimes, antes das prisões de 26 de Julho.
Se foi iniciada uma investigação, o JSMP não compreende porque razão o
interrogatório de Reinado e dos seus seguidores por parte dos promotores
públicos ainda não ocorreu, conforme exigido pelo Código de Processo Penal.
Além disso, se tivesse sido iniciada uma investigação de Reinado e dos seus
seguidores e se a acusação acreditasse serem necessárias medidas restritivas
(por exemplo, por razões que não foram enunciadas pelo tribunal), deveria ter
procurado obter um mandado de captura para possibilitar a aplicação dessas
medidas. O JSMP foi informado de que a PG não incitou as prisões de 26 de Julho
pela ADF.
O JSMP acredita que a falha nestes passos processuais e a falta de qualquer
declaração pública sobre uma investigação, indicam que a PG não começou a
investigação de Reinado antes da sua prisão a 26 de Julho.
O JSMP está preocupado com esta falta de acção por parte da PG. Esta
preocupação é ainda acentuada pela outra aparente falha até agora da acusação
em iniciar a investigação de Vicente “Railos” da Conceição.
O JSMP considera que os atrasos no início de acusações em processos
importantes podem ser interpretados como indicando que a PG é demasiado
vulnerável a pressões políticas externas, sejam elas da população ou de outros
órgãos de soberania.
O Estado de Direito exige não somente a existência de um serviço de acusação
independente do governo, formalmente e em termos práticos, mas também que
este seja visto e entendido como tal pela população, para garantir a confiança e
respeito pela ordem jurídica. O JSMP pede portanto à PG que assegure que o
princípio constitucional de igualdade perante a lei seja sempre visto como
respeitado, através da igual acusação imediata de todas as pessoas suspeitas do
cometimento de crimes, independentemente do seu estatuto político (…)
http://64.233.183.104/search?q=cache:Opv6kbKVGukJ:www.jsmp.minihub.org/Justice%2520update/2006/Alfredo/Reinado%2520Cases_pt.pdf+deten%C3%A7%C3%A3o+reinado+2006&hl=pt-PT&ct=clnk&cd=6&gl=pt